#BlackPinupGirls — Rafaela Lopes: "Pessoas brancas são mainstreams demais";

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Se você procurar “Hipsters” no Google, vão aparecer inúmeras imagens de gente considerada descolada tomando café do Starbucks. Hipster é aquela “tribo urbana” que virou tendência nos últimos anos por serem diferentes de todo mundo, os  hipsters são conhecidos por não gostarem do que é “mainstream”. Mas se você olhar no Google Imagens, você só vai ver gente branca lá sendo classificada como hipsters. Se você quiser ver um negro com as roupas “de hipster” e fazendo o que “os hipsters fazem”, vai ter que colocar “hipsters negros” no google, onde vai aparecer meia dúzia de imagens de pessoas negras lindas de morrer, e o resto vai ser só de gente branca. O mesmo acontece se você colocar Black Hipsters, apesar de o número de imagens de pessoas negras na pesquisa em inglês ser maior, ainda vai ter um mundo de gente branca lá.
Procure por Geek, Patricinha, Góticos, Roqueiros, Emos, Otakus, enfim, qualquer outra tribo urbana. Só o que você vai encontrar é gente branca, se quiser encontrar imagens de negros de qualquer uma dessas tribos, vai ter que digitar a tribo + negros. E mesmo assim a esmagadora maioria das imagens vai ser de gente branca - isso sem falar nas várias imagens de descriminação racial -. Será que negros não fazem parte de tribos? Será que negros não tem amigos, saem com sua turma, e curtem um estilo musical específico? Eu mesma vou me responder, dizendo que sim, nós fazemos parte de tribos. Durante os meus vinte anos de vida já fiz parte de diversas tribos, dos otakus, roqueiros, e geeks, e atualmente há quem me rotule de hipster/alternativa. E as pessoas que andavam/andam comigo nessas tribos, em sua maioria são pessoas negras. Afinal moro no Brasil, mais da metade da população é composta por pessoas negras.

Mas então porque quando procuramos no Google por qualquer tribo só encontramos pessoas brancas?  Por que quando ligamos a TV só encontramos pessoas brancas? E quando encontramos pessoas negras, elas são personagens secundários/a empregada/o ladrão? Porque não somos representados? A resposta é óbvia e dura: racismo. Deixamos de ser representados o tempo inteiro, não porque não existimos, mas sim, porque vivemos numa sociedade onde ser negro ou ter traços de negro significa ser feio. Nesse contexto nós crescemos e vivendo, com referências apenas do padrão eurocêntrico (branco). Quase sempre nos achando feios, e procurando parecer o mais brancos, e parecidos com as nossas referências brancas o quanto for possível. Uma das minhas “referências de estilo” são as pin ups.

 Segundo a Mundo Estranho as “pinups” eram modelos que estamparam pôsteres sensuais com uma estética muito própria nas décadas de 40 e 50. Popularizaram-se na Segunda Guerra Mundial, quando soldados norte-americanos penduravam seus pôsteres nos alojamentos (daí o nome “pin-up”, que significa “prender com tachinhas”, em inglês). As pin ups são conhecidas por terem os traços bem finos, delicados, bocas finas, cabelos lisos e franjinha. Não preciso dizer que não existiam pin ups negras, ou que na verdade, nenhuma nunca foi retratada.  Certa vez, li que o contexto de tempo em que as pin ups existiram foi um dos mais racistas da história, por isso não tinha pin up negra. E eu levei esse argumento para a vida por um bom tempo. Até me surgir a oportunidade de escrever esse texto, e ver, que não existe nem existiu tempo mais racista que outro. O mundo foi, e ainda é extremamente racista, se não fosse, as imagens que encontramos quando digitamos “hipsters” no Google, não seriam só de pessoas brancas.

Se o “tempo” em que vivemos fosse menos racista, não teriam chovido críticas quando Lupita Nyong'o foi eleita a mulher mais bonita do mundo. E comparações com outras negras “mais bonitas”, que só são consideradas “mais bonitas”, por terem traços embranquecidos. Seja o cabelo alisado, o nariz mais fino, o olho mais claro. E a Lupita não tem nenhum traço embranquecido, apesar do seu rosto extremamente perfeito, bem “delineado”, Lupita é uma negra sem traços brancos, e isso logo fez os racistas se irritarem e criticarem. Mas é fato que quando Lupita foi eleita a mulher mais bonita do mundo, as mulheres negras se sentiram representadas.

Voltando as pin ups, apesar de não ter nenhuma representação de pin up negra, eu me inspiro muito no estilo delas, quem me encontra no dia-a-dia sempre me vê com uma bandana vermelha na cabeça, uma blusa de bolinhas. Enfim, referências óbvias as mocinhas sensuais da segunda guerra, muito me encantam. Justamente por serem sensuais, apesar das pin ups serem usadas para a objetificação feminina para os homens. Sempre achei que elas representavam o início da libertação sexual feminina, apesar do “que angelical”. Mas pensando mais um pouco, vi também que nós negras, sempre fomos sinônimo de libertinagem, logo nossa libertação sexual, tem um sentido completamente diferente do das mulheres brancas, mas isso é assunto para outro texto. 
Filha da atriz Viola Davis,
a primeira mulher negra a ganhar o prêmio Emy

E, o que quero trazer a tona nesse texto, é a importância de nós negros e negras sermos representados. As pin ups não nos representa pelo contexto sexual. O povo negro praticamente criou o rock e o rei do rock é um homem branco. O rei do Pop era negro, mas se embranqueceu. Mas não seguiremos sem nos calar, se for preciso vamos nos inspirar nas pin ups pra nos sentirmos representadas, nos inspiraremos, eu vou continuar me inspirando pelo menos. Vamos fazer cosplay de Batman, e Mulher Maravilha, mesmo sendo personagens brancos. Vamos vestir nossas crianças de Viola Davis, e Lupita. Vamos mostrar que o povo negro existe e resiste, e já que me consideram hipster por aí, concluo que acho gente branca mainstream demais.






Leia também os demais textos do especial #BlackPinupGirls:

2 Comentários

  1. Ah, que texto maravilhoso. Fico muito feliz ao ver mais e mais negros colocando a voz no mundo para denunciar o racismo nosso de cada dia, que muitas vezes encontramos até dentro do próprio lar. Temos voz, vamos nos fazer ouvir e causar incômodo no status quo que resiste ao empoderamento crescente. Essa é a primeira etapa de uma tomada de consciência social, por isso é tão dolorosa para quem ousa tocar na ferida. Parabéns pelo blog! Gostei muito.

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    1. Oi, moço! Eu fiquei exatamente assim quando a Rafaela me mandou esse texto.
      Esse especial foi postado em novembro do ano passado com o intuito de trazer discussão acerca de um "espaço" ou estilo, como as Pinups, que ainda predomina como um lugar branco. E é exatamente isso, nos fazer ouvir e causa incômodo, pois, se permanecermos calados, concluirão que está tudo bem. Quando, claramente, não está.
      Fico imensamente feliz que tenha gostado da iniciativa, uma pena que não pude fazer esse ano, estava lotada de coisas na faculdade! Depois dá uma passada nos demais textos da série, os links estão ali abaixo, e confere os depoimentos das demais meninas!
      Adorei ver você por aqui, viu, volte mais vezes! :D

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